quinta-feira, 23 de julho de 2009

Sobre partir de si

João estava de pé, diante do edifício Premium II, onde trabalhava. Olhava para o topo do prédio, quase caindo para trás, tão grande era a construção. As pessoas passavam por João aos montes. Ele permanecia imóvel, apenas olhando para o alto. Alguns esbarravam nele, sem percebê-lo; outros o percebiam e confundiam com um louco; mas a maioria das pessoas nem notava.

"Sou uma formiguinha em um formigueiro. Apenas uma formiguinha em um formigueiro" - pensava ele. Sorria enquanto pensava assim, como que para amenizar a dor de se sentir tão só, mesmo no meio de uma multidão. "É um grande parodoxo. A sociedade moderna nos põe em contato com milhares de pessoas. A todo momento podemos ligar para alguém; as distâncias ficaram encurtadas por um click do mouse, mas nós nunca estivemos tão sós, tão necessitados de contato humano verdadeiro e tocável. São milhões de pessoas aglomeradas nessa cidade, mas poucas entram em contato com o seu coração. E depois morrem enfartadas e culpam os remédios e médicos, como se a pior doença não fosse a solidão."

João sentia que não queria mais fazer parte daquilo. Daquela massa informe de pessoas que se acotovelam e se aproximam somente para conversar com a mente, sem jamais falar ao coração. Mas se não queria fazer parte daquilo, para onde iria? Haveria alguma comunidade onde seus anseios seriam atendidos por completo? Achava que não. Então apenas olhava para o alto do prédio, respirando fundo e criando coragem para encarar mais um dia de trabalho, onde nada nem ninguém se importaria com ele. E ele, em resposta, tampouco se importaria.

E foi aí que João teve um estalo. Uma luz se acendeu sobre sua cabeça forçando-o a dizer: EUREKA! Se o mundo não se importava com as pessoas, ele se importaria. Naquele momento sentiu que não deveria ser o único a ter anseios de compartilhar sentimentos e emoções, deveriam haver outros. E esses também esperavam uma oportunidade para se mostrar, mas todos apenas esperavam e ninguém dava o primeiro passo.

João deixou de olhar o alto, e olhou ao seu redor. Muitas pessoas passavam e se esbarravam, algumas se olhavam tímidas, desejando receber um "bom dia", desejando ver no outro uma face conhecida e querida. Também ele queria receber um "bom dia", um simples "bom dia" e um abraço. Se ele não seria o primeiro a receber, então deveria ser o primeiro a dar.

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