quarta-feira, 11 de setembro de 2013

Infinito

Ontem, sonhei. No céu de Brasília, ao entardecer, havia uma imensa aurora boreal. O alaranjado e o vermelho se misturavam ao azul escuro do firmamento e ainda umas poucas nuvens podiam ser vistas, tingidas de dourado pelo sol que já se punha atrás da Torre de TV. Uma visão belíssima, um fenômeno indescritível até em sonho. Encantado, sentei sobre a grama da esplanada e me pus a contemplar, em silêncio, tamanha dádiva. Ah! Meu espírito crescia até os céus. Sentia-me no Paraíso, repleto de uma felicidade sem fim que inundava meu interior. Sorria largamente. Que impressionante experiência!

Calei todo meu exterior e interior. Alguns amigos – não os reconheci em sonho – sentaram ao meu lado e quiseram comentar algo comigo, mas não dei ouvidos a eles. Éramos eu e o céu! E só! Se estivesse acordado, provavelmente me preocuparia em tirar fotos e registrar o momento, publicando-o nas redes sociais. No sonho, não. Meu inconsciente, responsável por me proporcionar aqueles incríveis momentos de fascínio, sabia o que era mais importante. O mais importante, diante de algo tão grandioso, era calar-me, contemplar, e deixar que minha pequenez transbordasse imensidão. Eu era parte do infinito.

Não posso descrever com precisão as sensações que se passavam em mim naquele momento. Desculpem! Não consigo colocar em palavras, mas posso dizer o que já disse, e isso basta: eu era parte do infinito!

Mas, então, dessa experiência maravilhosa, seguiu-se outra aterradora, coisas que somente os sonhos podem nos proporcionar. Eis que surgiram raios vermelhos, reluzindo no céu, de um ponto a outro da aurora boreal. Os raios não desciam do céu, mas corriam na horizontal, lá em cima, tão rápido quanto o piscar de olhos. Eram muitos e produziam trovões perturbadores, que fizeram meu coração disparar. A cena outrora tão calma transformou-se em confusão e desconforto. Os que estavam próximos a mim corriam e queriam me levar, mas eu permaneci imóvel, ainda surpreendido e encantado. Apesar do pavor que os raios e trovões me causavam, a sensação de infinito continuava forte em meu peito, e eu sentia que era preciso passar também por isso se quisesse fazer parte de algo tão grandioso.
Meu corpo tremia, meu peito arfava, meus olhos tinham o instinto de se fechar a cada ronco de trovão, mas eu procurava os manter abertos, não querendo perder um segundo sequer de tudo o que acontecia. Meu espírito estava em êxtase e meu corpo estava em caos.

A noite avançava. O céu já era breu. Os raios continuavam, surgindo e sumindo velozes, tingindo de vermelho a paisagem. Um vento gelado passou a percorrer a esplanada. O frio passou a ser intenso, como se eu estivesse mergulhado em gelo. Frio intenso, medo, falta de ar, coração aos pulos! Eu tive certeza de que meu corpo iria sucumbir, ou explodir, com tamanhas reações. Mas eu continuava parado, apenas contemplando e procurando manter a calma, elevando meus pensamentos e atenção ao fenômeno acima de mim.

E então, como se já não fosse possível fazer do sonho algo mais incrível e fora da realidade, começou a chover. Não uma chuva comum, claro. Chovia em cascatas. Quatro ou cinco imensas cachoeiras brotavam do céu, lançando suas águas frias sobre mim. Sim! Era eu, e apenas eu, o alvo das águas. Era para mim, e somente para mim, todo aquele fantástico cenário.

Era possível ver com perfeição o local de onde surgiam as chuvas de cachoeiras. Não vinham de nuvens, mas como que de fendas no firmamento negro. As águas percorriam todos os milhares de quilômetros do céu até o chão e me encharcavam, abençoando-me.

Talvez nesse momento, por conta do absurdo do que acontecia ali, pela primeira vez me dei conta de que sonhava. O pavor amenizou, as sensações de desconforto foram sumindo aos poucos e passei a estar mais consciente de que podia fazer outra coisa que não contemplar em silêncio o magnífico espetáculo. Minha condição física foi voltando ao normal e vagarosamente eu despertei.

Abri os olhos e me vi em minha cama, em meu pequeno quarto, segundos antes de o despertador tocar. Fiquei atônito por vários minutos, ainda deitado, repassando o sonho repetidas vezes na memória. Fui me percebendo, observando que havia um aperto em meu peito, tendo o sonho produzido reações físicas reais em mim. Levantei para seguir com o dia de trabalho e afazeres tão pequenos diante de toda a grandiosidade do Universo e da Natureza. Quis me sentir pequeno, quis pensar em minha vida como algo inútil e insosso.

Antes de sair para o trabalho, no entanto, encontrei, aos pés da escada, minha pequena sobrinha brincando. A me ver ela sorriu, e, assim que desci os degraus, levantou-se e pediu um abraço. Abracei-a. Uma sensação indescritível me invadiu. E eu fazia parte do Infinito!


Fui sorrindo para o trabalho, consciente de que as coisas tem o tamanho que damos a elas.