terça-feira, 27 de janeiro de 2009

Sobre olhos que se olham

Os olhos se encontram. Olhos que já sorriram, se entristeceram e se preocuparam. Preocupações que vieram e outrora cansaram a vista, agora fraca e débil, incapaz de preocupar-se novamente, mas ainda capaz de focar na retina a luz que brilhou por muitas primaveras ao seu lado. Luz tênue e vacilante que nos próximos invernos irremediavelmente se apagará. Os olhos permanecem onde estão, recordando, não mais envergonhados em se fitar, demoradamente. Não há mais vergonha, o tempo a levou.

E que é o tempo? – perguntam, sem a pressa de obter resposta. A pergunta se esvai, se perde no vento, próprio objeto da questão. Da mesma forma foram engolidas e varridas tantas memórias de tudo que afetou seus olhos cansados e mãos calejadas. Memórias que, bem ou mal, não mais podem afetar.

Com o olhar, as palavras escapam. Sobra o sorriso. Sobra o toque. Mais que lembranças, presença. De tudo o que já importou, apenas ela age agora. Apenas o que é presença, o que é presente pode os incomodar, ou alegrar. Foram precisos muitos anos para compreender, mas o vento que carrega barcos para longe sempre volta trazendo a nau da sabedoria. E essa nau ensina que o que passou já foi e o que virá não é; só resta a presença; doce ou amarga, é ela que os faz viver.

Ainda assim, saudosamente se olham. O passado se faz vida, pois o sentimento se faz presente. As mãos se tocam e se apertam, encorajam-se a viajar de volta com o vento, sem deixar que o peso de seus corpos deixe de sinalizar sua presença.

Um comentário:

  1. Não me visto com meu passado e meu presente é tão inconsciente que não serve de capa mais...

    Choro sem freio e sem lágrima... Uma maneira de chamar atenção, uma maneira de sofrer em vão.

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