quarta-feira, 21 de outubro de 2009

Sobre um balão e uma viagem - parte 3

O homem-viajante - como será chamado o palestrante a partir de agora, porque era assim que Ben se lembraria dele mais tarde - falava de suas inúmeras viagens, descrevendo algumas paisagens usando palavras que procuravam encantar as crianças.

- Um belo dia, eu sobrevoei uma floresta imensa! - dizia ele. Nada naquela floresta parecia ter sido feito para os homens, mas para gigantes. Era impressionante o tamanho das árvores. Em alguns pontos, eu podia ver um rio cortando a floresta. O rio também era imenso. Se eu estivesse no chão, aposto que de uma margem não poderia ver a outra.
- Nossa! - respondiam algumas crianças entusiasmadas.
- É que nem o mar, moço. Quando a gente tá na praia, a gente não vê o outro lado, é muito longe - completava um dos meninos.
- Exatamente. Igual o mar, só que bem menor. Aliás... já sobrevoei o mar também. Foram longos dias sem avistar nada, apenas o oceano azul. Toda a minha provisão estava no balão e eu tinha gás suficiente para alguns dias. Era apenas o céu sobre mim, e o mar aos meus pés, a muitos metros abaixo, claro.

Ben ouvia tudo o que o homem-viajante dizia. Começava a ficar encantado com a ideia de subir em um balão e vislumbrar as maravilhas do mundo. Adorava ver as figuras de alguns livros e gostava principalmente daqueles que mostravam a natureza florida, verde e imensa - como dizia o homem-viajante.

Ben ouvia tudo, mas sequer olhou para o homem-viajante desde que se juntara à turma. O menino não tirava os olhos do balão que crescia a cada segundo. Percebeu que logo abaixo do balão, perto da abertura inferior, havia uma espécie de fogão, que se acendia de tempos em tempos, jogando ar para dentro da imensa bolha que se formava. Sempre havia alguém puxando uma corda quando o fogo saía.

O balão começou a subir levemente depois alguns longos minutos de palestra - pareceram longos para Ben, mas em outros momentos de sua vida, o mesmo espaço de tempo pareceria voar, passar como um relâmpago; e isso não acontece só para as crianças, mas para todos nós, mesmo quando deixamos de ser crianças. Ben viu a cabine ligada ao balão erguer-se na medida em que o balão subia. Imaginou que tudo começaria a voar alto a qualquer momento, bem ali, diante de seus olhos. Quem olhasse para Ben nesse momento, veria olhos bem arregalados brilhando, a cabeça inclinada para cima, a boca levemente aberta. As crianças começaram a gritar. Assim como Ben, todas achavam que o balão começaria a subir. Ben não gritava. O garoto estava fascinado, sentia no peito uma vontade enorme de entrar na cabine e voar.

O balão parou de subir, de repente. Ben, então, percebeu que tudo estava preso ao chão por cordas. O balão só subiria se as cordas fossem desatadas. Ben lembrou de seu cachorro: ele só podia correr, quando soltavam a corrente de seu pescoço. Se não o soltassem, o máximo que poderia fazer era correr em círculos, mas pros cachorros, não basta correr em círculos, eles sempre querem correr mais. "Algumas coisas só podem acontecer se desamarrarmos aquilo que prende elas ao chão", pensou, "e o balão só vai subir se alguém soltá-lo da terra. Será que a professora não quer soltar?"

Enquanto pensava, os meninos da turma começaram a gritar: "Voa, voa, voa!!!". O homem-viajante tentou conter o ânimo exacerbado da turma. Explicou que não voaria, o balão estava ali só de demonstração, para animá-los um pouco. Ben entristeceu-se e a sensação que tinha no peito começou a morrer. De repente, se deu conta de que queria muito que o balão voasse, mas não apenas voasse, ele queria estar dentro. E, inexplicavelmente - ele já havia esquecido o que acontecera de manhã -, queria ir de balão buscar sua mãe em casa.

Sem pensar muito - quando pensam muito, as crianças desistem de fazer algumas coisas, são como os adultos - correu até o balão, cuidando para que a professora não o visse. O medo se instalou em seu coração - as crianças temem muito os adultos, principalmente os professores. Não se importando, e sabendo que o que fazia era importante, chegou até o balão e abriu a porta da cabine.

Ben entrou na cabine, ansioso, coração batendo forte. Estava prestes a fazer a maior viagem da sua vida, ainda que tivesse apenas 6 anos. Antes que alguém o visse, desamarrou o nó que prendia o imenso balão ao chão. Sentiu seu corpo perder o equilíbrio momentaneamente. Sentiu-se leve, e essa sensação o agradou de tal forma que o medo se dissipou em segundos. Ele estava voando, e a cada segundo voava mais longe. Longe de tudo, de todos, apenas voava e via todas as coisas tomarem o seu verdadeiro tamanho: "no fundo", pensou o menino, "é tudo tão pequeno."

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