quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Sobre uma conversa

- Pra alguém tão pequeno, você parece bastante forte, garoto!
- Obrigado! O senhor também é bastante gentil pra alguém tão grande!
- Mas as pessoas grandes não podem ser gentis?
- Podem sim, senhor.
- Chame-me de você, por favor!
- Mas o senhor é muito alto e bem mais velho pra eu te chamar de você.
- Mesmo assim, chame-me de você! Não se preocupe, somos amigos não somos?
- Somos sim, senhor. Quer dizer. Somos sim!
- E você dizia que as pessoas grandes podem ser gentis...
- Sim, elas podem. Mas não é o que acontece normalmente, entende? As pessoas grandes acham que podem tomar conta de tudo e mandar. E aí viram pra gente que é pequeno e são sem educação, e não tão nem aí, sabe?
- E você acha que eu sou assim?
- Não. Mas a gente se acostuma a achar que é sempre assim.
- Sei, sei. Sei muito bem. Sabe, algumas pessoas não entenderam o porquê de serem grandes. O grande está ali para servir de apoio ao pequeno, o pequeno, por sua vez, deve aprender a crescer com o que é grande. Você já foi à escola?
- Sim.
- Pois bem, o professor jamais pode desdenhar do aluno por este não saber alguma coisa. Um dia ele foi aluno e precisou aprender. E o aluno deve levar a sério o professor, porque tem muito o que aprender com ele. Mas quem é mais importante, o professor ou o aluno?
- O professor. Sem ele o aluno não vai aprender.
- Mas sem o aluno, o que seria do professor?
- ...
- Vê? Um só existe se o outro existir.
- Aham. É como o pássaro e a árvore.
- Não entendo.
- Assim, a minha mãe me disse uma vez que sem a árvore o pássaro não tem abrigo, mas sem o pássaro as sementes da árvore não se espalham.
- Isso! Captou bem a mensagem. Dessa forma, a árvore, por maior e mais bela que seja, não pode dizer ao pássaro que ele não é nada.
- E o pássaro não pode zombar da árvore por ela não poder voar!
- Nessa eu não tinha pensado. Você está me surpreendendo.
- Mas... e quando é a árvore que deseja ser pássaro pra poder voar?
- Todos desejam... é inerente às criaturas! O que a árvore deve saber é que o pássaro deseja ser falcão, e este deseja ser um grande peixe, que talvez deseje ser uma árvore...
- E por que as coisas simplesmente não se satisfazem com o que são?
- Por que nessa vida, elas são apenas espelho do que serão. E por que no fundo, não se compreenderam como são.
- Como assim?
- A árvore não pára pra pensar no quanto é bela e importante. Ela fica olhando pra fora, só pra fora. Não olha pra dentro.
- Entendo. Se eu olhar pra dentro vou me ver grande?
- Não, você é pequeno. Se olhar pra dentro vai se ver como é. E no seu caso, vai ver o quanto é importante para aqueles que te amam. E, posso te contar um segredo?
- Pode.
- Quando você olhar pra dentro de si, você vai me encontrar.
- Como assim? Você não está no céu... E eu sou muito pequeno pra você caber aqui dentro.
- Pois bem, aqui voltamos ao ponto de partida. Você disse que eu sou muito grande, não é?
- É... e é por isso que eu te chamava de senhor.
- É. Mas você não imagina o quanto eu sou grande. Sou maior do que você pensa, e posso mais do que qualquer um.
- Então, como você diz que vou te encontrar aqui? Eu, tão pequeno.
- Por que não uso meu poder para dominar, ao contrário dos reis dessa terra. Não guardo minhas riquezas para mim, ao contrário dos ricos dessa terra. Não me imponho para ser respeitado ou adorado, ao contrário dos grandes dessa terra. Uso meu poder para poder estar perto dos que eu amo, partilho minhas riquezas e rebaixo-me para que meus filhos se sintam a vontade de falar comigo, assim como estamos fazendo agora. Entende?
- Entendo.
- Mas preste atenção. Ainda há uma diferença entre as analogias que fizemos.
- Qual?
- Você me disse que o pássaro precisa da árvore e árvore do pássaro e um não pode zombar do outro não é?
- É.
- Bem, eu me fiz necessitado de você, mas no fundo, não preciso de você pra ser quem sou. Já você, sem mim, não é nada.
- Eita.
- Hahahahahaha. Mas não se assuste. Apesar de eu não precisar de você para ser quem sou, eu não seria eu mesmo se não me importasse com você.
- Hein? Essa eu não entendi.
- E nem vai entender hoje. Boa noite, tá?
- Boa noite.

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