quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Sobre uma conversa

Ficou atônito! Como assim, de graça? Nada nesse mundo é assim, de graça. Apesar de achar bem suspeito, aceitou, mas não sem antes questionar.
- Assim? De graça?
- É. De graça - respondeu o outro.
- Mas... mas eu... quanto é? Quanto você quer?
- Não quero nada, é de graça! - disse rindo levemente.
Olhou para aquilo que havia em sua mão. Ele recebera, de graça, e não era nem seu aniversário.
- Tá. Ok! Mas agora eu tenho que te retribuir de alguma forma. O que posso fazer por você?
- Nada. Não precisa fazer nada.
- Ok. Eu sei que não precisa, é de graça e aquela coisa toda. Mas agora eu quero retribuir. Não me sentirei bem se não retribuir.
- Então, não retribua. Não por isso.
Aquela conversa já o estava cansando. Ok. Iria pensar em algo pra dar de retribuição. Não precisava contar o que era, nem quando... era só dar de surpresa. Mas parecia que o outro estava entendendo o que ia acontecer, porque logo em seguida comentou:
- E se estiver pensando em fazer a mesma surpresa que eu, só por que está se sentindo obrigado a isso, pode esquecer. Não vai ser a mesma cosia. Nunca vai ser a mesma coisa. Por que eu já me antecipei. Eu já o presenteei, de graça.
- Puts. Mas então. Eu vou ter uma dívida pra sempre com você - disse, tentando achar uma saída para aquela situação embaraçosa.
- Sim. E não.
- Como assim? - ele não estava entendendo.
O outro respondeu, calmamente:
- Vai ser pra sempre, mas não é uma dívida, por que foi um presente e não precisa ser paga.
- E o que vai ser pra sempre, então?
- A sua gratidão. A lembrança da surpresa. A esperança de um dia receber outro presente assim, gratuitamente, e sentir-se amado como hoje.
A gratidão. O outro falara em gratidão e só agora ele percebia que não agradecera.
- Errr. É... Ok. Antes de mais nada, muito obrigado, viu? - disse timidamente.
- De nada. Literalmente, de nada.
Mas não era só isso. Não era só agradecer. Por que esse gesto tão repentino? Ele estava começando a ficar nervoso, por que não entendia. Pensou, antes de continuar.
- Ok -disse. - Agora, qualquer coisa que eu te faça, de certa forma, vai ser por retribuição a esse seu gesto. Querendo ou não, vai ser. E aí? Como fica?
O outro parou um tempo. Talvez não tivesse pensado nisso ainda. Agora, tudo era resposta. Nada mais seria uma simples ação, desprovida de sentido, pura, sem interesse.
- Então que assim seja.
- E tudo bem pra você? Vai ser tudo por retribuição, e nada vai ser natural.
- Não é retribuição, por que não se retribui um presente. E é natural, por que não é obrigado.
Agora ele estava nervoso, realmente.
- Não é por obrigação, mas é por retribuição. Eu quero retribuir - disse em tom forte - por que eu também te amo!
Silêncio.
Respiração forte... respiração leve.
- Ah - disse O outro depois de um momento. - Agora sim.
Ele sorriu. "É - pensou - agora sim".
- Boa noite, Pai.
- Boa noite, filho.
E as luzes se apagaram.

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