João olhou para o seu filho com
afeto. Sempre soube que um dia iria sentir o ápice do amor que uma pessoa pode
sentir por outra, ou pela vida. Imaginou que talvez fosse aquele o momento. Ele
e seu filho tão amado, a maior de suas alegrias e realizações, frente a frente
e João sentindo dentro de si uma explosão de afeto, uma felicidade incontida. João
sorriu.
Pedrinho, indiferente ao súbito
ataque de emoção do pai, continuava brincando com seus brinquedos de animais,
fazendo barulhos, criando e recriando mundos... Agora, na sua cabeça, uma
floresta inteira se formava: árvores gigantes recobertas por imensas
trepadeiras em seus troncos; uma chuva rala caindo serena sobre as copas volumosas,
deixando poucas gotas respingarem no chão; animais selvagens caminhando,
correndo, rastejando, caçando, cortejando, parados, esperando.
A vida na mente de Pedro era incrível.
A imaginação pulsava e em certos momentos se materializava em gritos que saíam
de sua boca, vôos de pterossauros com seus braços curtos, barulhos de elefante
tão próximos ao real quanto uma criança é capaz e a força bruta de uma ancestral
tartaruga gigante derrubando blocos de brinquedos. Um gorila atacava um leão
que era salvo por um tigre. Um pássaro azul sobrevoava os galhos mais baixos,
chamando toda a atenção da floresta para si, para o seu vôo gracioso e sua cor tão
bela. Ah! Aquele pássaro azul. João o viu na mão do filho e se recordou de como
o pássaro era capaz de ser mais importante do que todas as outras maravilhas
acontecendo juntas no meio da floresta. João se lembrou de ter corrido atrás
deste pássaro azul. E Pedrinho seguiu brincando e sua imaginação se materializava
de tal forma que João, apenas assistindo com carinho a toda a brincadeira, pôde
imaginar tal qual o filho imaginava.
Quando João viu Pedro confrontar
uma raia com o pterossauro, riu largamente e decidiu não falar para o filho
sobre o seu erro. Suposto erro. Lembrou-se de seus tempos de criança e dos
mundos que criava enquanto lia livros ou esperava o pai busca-lo na escola. Era
um excelente passa-tempo imaginar que esse mundo em que se vive pudesse ser
repleto de grandes aventuras. Tudo era possível. E tudo, sempre,dava tão certo.
E assim, Pedrinho brincou por
longos minutos que para ele pareceram vidas inteiras. Brincou sem barreiras
criando para si mundos e personagens magníficos. E João... João sorriu por
longos minutos, que para ele passaram em um piscar de olhos. Sorriu sem
barreiras, agradecido pela vida real se fazer, no fim das contas, tão
fascinante quanto a imaginação que criara quando era criança.